Eu já passei da idade de ter um tipo físico de homem ideal para eu me
relacionar. Antes, só se fosse estranho (bem estranho). Tivesse um
figurino perturbado. Gostasse de rock mais que tudo. Tivesse no mínimo
um piercing (e uma tatuagem gigante). Soubesse tocar algum instrumento. E
usasse All Star. Uma coisa meio Dave Grohl. Hoje em dia eu continuo
insistindo no quesito All Star e rock´n roll, mas confesso que muita
coisa mudou. É, pessoal, não tem jeito. Relacionamento a gente constrói.
Dia após dia. Dosando paciência, silêncios e longas conversas.
Engraçado que quando a gente pára de acreditar em “amor da vida”, um
amor pra vida da gente aparece. Sem o glamour da alma gêmea. Sem as
promessas de ser pra sempre. Sem borboletas no estômago. Sem noites de
insônia. É uma coisa simples do tipo: você conhece o cara. Começa, aos
poucos, a admirá-lo. A achá-lo foda. E, quando vê, você tá fazendo
coraçãozinho com a mão igual uma pangaré. (E escrevendo textos no blog
para que ele entenda uma coisa: dessa vez, meu caro, é diferente). Adeus
expectativas irreais, adeus sonhos de adolescente. Ele vai esquecer
todo mês o aniversário de namoro, mas vai se lembrar sempre que você
gosta do seu pão-de-sal bem branco (e com muito queijo). Ele não vai
fazer declarações românticas e jantares à luz de vela, mas vai saber que
você está de TPM no primeiro “Oi”, te perdoando docemente de qualquer
frase dita com mais rispidez. Ah, gente, sei lá. Descobri que gosto
mesmo é do tal amor. DA PAIXÃO, NÃO. Depois de anos escrevendo sobre
querer alguém que me tire o chão, que me roube o ar, venho humildemente
me retificar. EU QUERO ALGUÉM QUE DIVIDA O CHÃO COMIGO. QUERO ALGUÉM QUE
ME TRAGA FÔLEGO. Entenderam? Quero dormir abraçada sem susto. Quero
acordar e ver que (aconteça o que acontecer), tudo vai estar em seu
lugar. Sem ansiedades. Sem montanhas-russas. Antes eu achava que, se não
tivesse paixão, eu iria parar de escrever, minha inspiração iria acabar
e meus futuros livros iriam pra seção B da auto-ajuda, com um monte de
margaridinhas na capa. Mas, caramba! Descobri que não é nada disso. Não
existe nada mais contestador do que amar uma pessoa só. Amar é ser
rebelde. É atravessar o escuro. É, no meu caso, mudar o conceito de tudo
o que já pensei que pudesse ser amor. Não, antes era paixão. Antes era
imaturidade. Antes era uma procura por mim mesma que não tinha
acontecido. Sei que já falei muito sobre amor, acho que é o grande tema
da vida da gente. Mas amor não é só poesia e refrão. Amor é
reconstrução.É ritmo. Pausas. Desafinos. E desafios. Demorei anos pra
concordar com meu querido Cazuza: “eu quero um amor tranqüilo, com
sabor de fruta mordida”. Antes, ao ouvir essa música, eu sempre pensava
(e não dizia): porra, que tédio! Ah, Cazuza! Ele sempre soube. Paixão é
para os fracos. Mas amar - ah, o amor! - AMAR É PUNK.
(Fernanda Mello)
(Fernanda Mello)